Hoje comemora-se o 38.º aniversário da Revolução dos Cravos. O que resta do 25 de Abril de 1974? O que realmente se conquistou nesse dia? A resposta a esta e outras perguntas ainda estão gravadas nas músicas e letras de Zeca Afonso.
Em 2007 foram lançados dois álbuns que homenageavam José Afonso: "C'os Tamaquinhas do Zeca" dos Couple Coffee e "Convexo - A Música de Zeca Afonso" de Jacinta. O primeiro dava às músicas de Zeca um tom brasileiro, com algum samba e muita alegria, mesmo nas letras mais trágicas. O segundo conduzia Zeca ao jazz mais puro, tirando alguns artifícios fáceis da música popular e acrescentando robustez. Tanto um como outro foram parar à minha discografia pessoal não só por gostar dos Couple Coffee e da Jacinta mas também pelo brilhantismo que acrescentaram à memória de Zeca Afonso.
Jacinta tem uma poderosa voz e uma presença em palco que se agiganta. Como qualquer artista de jazz que é prefiro-a ao vivo que em disco de estúdio, mas as bases dos concertos são esses álbuns. Jacinta é das Jazz Singers que mais me encanta e deleita. A primeira vez que a ouvi ao vivo foi no antigo Hot Club, estava então Jacinta grávida e eu no meu primeiro ano de faculdade. Trago-vos aqui "A Morte Saiu à Rua" do seu álbum de 2007, "Convexo - A Música de Zeca Afonso". Esta música surgiu pela primeira vez no álbum "Eu Vou Ser Como a Toupeira" editado em 1972 e é dedicada ao pintor, artista plástico e militante do PCP José Dias Coelho, assassinado a tiro a 19 de Dezembro de 1961 por agentes da PIDE na então Rua dos Lusíadas, que hoje tem o seu nome, em Alcântara, perseguiram-no, cercaram-no e dispararam dois tiros, um à queima-roupa, em pleno peito, deitando-o por terra, o outro foi disparado com ele já no chão a morrer.
A morte saiu à rua num dia assim
Naquele lugar sem nome para qualquer fim
Uma gota rubra sobre a calçada cai
E um rio de sangue de um peito aberto sai
O vento que dá nas canas do canavial
E a foice duma ceifeira de Portugal
E o som da bigorna como um clarim do céu
Vão dizendo em toda a parte o Pintor morreu
Teu sangue, Pintor, reclama outra morte igual
Só olho por olho e dente por dente vale
À lei assassina, à morte que te matou
Teu corpo pertence à terra que te abraçou
Aqui te afirmamos dente por dente assim
Que um dia rirá melhor quem rirá por fim
Na curva da estrada há covas feitas no chão
E em todas florirão rosas de uma nação